A 21 de Março comemora-se o Dia Mundial do Sono. Não quisemos deixar passar a data em branco. Afinal, o sono faz parte da nossa rotina diária e é através dele que ganhamos energia para trabalhar e para enfrentar o dia seguinte com mais ânimo. Mas para que isso aconteça é necessário dormir bem e evitar as típicas perturbações do sono. Tudo se complica se o(a) nosso(a) parceiro(a) sofre de roncopatia ou de apneia do sono, “duas patologias distintas dentro dos distúrbios respiratórios durante o sono”. Este foi um dos temas debatidos em entrevista ao Dr. Miguel Ferreira, otorrinolaringologista do Hospital Ordem do Carmo, à Dra. Rosa Cruz, pneumologista do mesmo hospital e ao Dr. António Manuel Paiva, médico otorrinolaringologista dos Hospitais da Universidade de Coimbra e presidente da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (SPORL). Está ainda convidado a conhecer as principais recomendações para ter um sono de qualidade e a medir o seu grau de sonolência durante o dia, através da Escala de Sonolência de Epworth.
“O sono é fundamental no repouso e na sensação de bem-estar que o ser humano necessita diariamente. Qualquer perturbação do ciclo do sono terá consequências na saúde”, afirma a Dra. Rosa Cruz. Para o presidente da SPORL, “sob o ponto de vista da otorrinolaringologia, o sono influencia a fisiologia das vias aéreas superiores, na medida em que contribui de forma significativa à resistência oferecida pelas suas estruturas à passagem do ar: assim, o nariz e as fossas nasais, a faringe, laringe, traqueia e a caixa torácica são as diferentes zonas de resistência, sendo a nasal a mais importante”. O mesmo especialista afirma que “durante o sono, há uma diminuição do tonus dos músculos”. A roncopatia e a apneia obstrutiva do sono são duas patologias mais frequentes dentro dos distúrbios respiratórios durante o sono.
A roncopatia é o vulgo ressonar e o síndroma da apneia obstrutiva do sono (SAOS) acontece quando um indivíduo pára de respirar enquanto dorme. “Crianças e adultos podem ser afectados pelo SAOS, contudo a sua prevalência é maior nos adultos do sexo masculino, entre os 30 e os 50 anos. A prevalência da SAOS sintomática na população adulta é de 4 por cento nos homens e 2 por cento nas mulheres”, afirma a pneumologista. Por outro lado, “em cada cem pessoas, vinte sofrem de roncopatia e uma tem SAOS”, diz o Dr. Miguel Ferreira. Muitas pessoas consideram a roncopatia normal. No entanto, “é uma doença que deve ser estudada e tratada. Normalmente, o roncopata puro sem outros distúrbios respiratórios durante o sono não tem quaisquer queixas, excepto alguma secura da boca nas situações em que há obstrução nasal permanente. Nestas situações, a respiração nocturna faz-se predominantemente pela boca”, acrescenta o otorrinolaringologista. Além disto, o roncopata não se queixa de qualquer outra alteração e, muitas vezes, não procura um especialista. Por outro lado, explica o Dr. Miguel Ferreira, “o ressonar é uma das maiores causas de alterações no relacionamento e harmonia familiar nos Estados Unidos da América. Frequentemente, os casais dormem em quartos separados com todas as implicações familiares e afectivas decorrentes de uma situação contranatura como esta, acabando alguns casais em divórcio”. Isto significa que a roncopatia acaba por afectar em larga escala os que partilham o espaço com a pessoa que ressona.
“Transtornos funcionais, cefaleias matinais, impotência, transtornos do carácter, alterações de diurese nocturnas, alterações endócrinas, complicações pulmonares, cardiovasculares, neurológicas, hematológicas e de alteração no processo de envelhecimento” são algumas das consequências destas duas patologias, destacadas pelo Dr. António Manuel Paiva. Na SAOS, o grande problema passa pela paragem respiratória nocturna. O otorrinolaringologista do Hospital da Ordem do Carmo explica que “o paciente pára de respirar (paragem maior que dez segundos) – apneias, e/ou tem períodos de paragens inferiores a dez segundos mas com grande diminuição de oxigénio no sangue – hipopneias”.
A roncopatia e a SAOS têm origem numa obstrução das vias áreas superiores. “Entre o nariz e a traqueia tem que existir uma alteração anatómica, um aperto que provoque o clássico ruído do ressonar e a obstrução que é a causa destas apneias. Quase sempre essa obstrução é facilmente identificável pelo médico especialista quando este avalia o paciente através dos seus meios auxiliares de diagnóstico: a polissonografia e o TAC das vias aéreas superiores”, explica o Dr. Miguel Ferreira.
O presidente da SPORL defende a cirurgia como solução destas duas doenças “porque vai permitir melhorias da função nasal, o alargamento da oro-faringe em todas as dimensões, o encurtamento do véu do palato e o aumento da tensão dos tecidos moles adelgaçantes”. A hipótese de cirurgia deve ser ponderada entre o paciente e o seu médico. Também o Dr. Miguel Ferreira defende que “a cirurgia ocupa um lugar muito importante no tratamento destas patologias. É sabido que o factor isolado mais importante para o menor sucesso destas cirurgias é o excesso de peso/índice de massa corporal. Pelo que, se tem excesso de peso, terá forçosamente de o perder para resolver a sua roncopatia/ ou a sua SAOS”. O mesmo especialista explica quais são as alternativas quando a cirurgia não está indicada a determinado paciente. “Existem aparelhos que provocam o aumento da pressão de ar inspirado, para que este vença a resistência da obstrução. O aparelho mais utilizado é o CPAP (pressão positiva contínua na via aérea)”.